Financiamento Sustentável in a Nutshell

ISEG - Executive Education  / 17.03.2020

O Financiamento Sustentável constitui um dos temas centrais da agenda internacional e do setor financeiro. Christine Lagarde, Presidente do Banco Central Europeu tem vindo a referir a importância de incluir as alterações climáticas na política monetária europeia, o que revela um reconhecimento explícito da ligação entre o clima e o setor financeiro.

De acordo com a Comissão Europeia:

“... a expressão «financiamento sustentável» designa, em geral, um processo pelo qual se integram devidamente as considerações ambientais e sociais na tomada de decisões de investimento, conduzindo a um maior investimento em atividades sustentáveis e de longo prazo. Mais especificamente, as questões ambientais estão relacionadas com a atenuação das alterações climáticas e a adaptação às mesmas, bem como com o ambiente em termos mais alargados e com os riscos relacionados (p. ex.: catástrofes naturais)

 

Apesar do Financiamento Sustentável incluir as componentes ambientais, sociais e de governação, atualmente a agenda internacional está focada na área ambiental, em particular no tema das alterações climáticas. Isto deve-se, essencialmente, ao facto de as perdas financeiras associadas aos danos ambientais resultantes de catástrofes ambientais, terem aumentado significativamente nas últimas duas décadas.

Segundo o ex-governador do Banco de Inglaterra, Mark Carney,

desde 1980 o número registado de perdas relacionadas com eventos climáticos triplicou; as perdas das seguradoras (ajustadas pela inflação) por estes eventos aumentaram de uma média anual de 10 mil milhões para 50 mil milhões de dólares na última década” 

De acordo com o Plano de Ação da Comissão Europeia para Financiar o Crescimento Sustentável

“entre 2000 e 2016, as catástrofes relacionadas com o clima verificadas anualmente a nível mundial aumentaram 46%, enquanto as perdas económicas resultantes de fenómenos meteorológicos extremos a nível mundial aumentaram 86% entre 2007 e 2016 (117 mil milhões de EUR em 2016)”   

O reconhecimento de que as alterações climáticas constituem riscos financeiros para as empresas foi dado em 2015 pela Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD) do Financial Stability Board (FSB), que concluiu que as alterações climáticas trazem um conjunto de riscos financeiros de transição e riscos físicos, bem como diversas oportunidades que contribuem, também, para os impactes financeiros nas organizações. Com esta abordagem, criou-se uma lógica financeira que identifica quer riscos quer oportunidades para as organizações decorrentes das alterações climáticas, argumentando que os investidores querem saber como é que as organizações se estão a preparar e a adaptar para o facto de a temperatura média do ar ir aumentar na segunda metade deste século.

O reconhecimento de que as alterações climáticas constituem um risco para o setor financeiro foi dado em 2019 com a publicação de um relatório intitulado “A call for action Climate change as a source of financial risk” produzido pela Network for Greening the Financial System. Neste relatório lê-se que:

“os riscos relacionados ao clima são uma fonte de risco financeiro e, portanto, caem diretamente dentro dos mandatos dos bancos centrais e dos supervisores para garantirem que o sistema financeiro seja resiliente a esses riscos.”

Em fevereiro de 2020, Christine Lagarde, Presidente do Banco Central Europeu afirmou também que:

“as mudanças climáticas constituem um grande desafio, causando ameaças e oportunidades que afetarão significativamente a economia e o setor financeiro, dependendo do cenário final de emissões de carbono que eventualmente se efetivar”.

Apesar deste tema parecer ser novo na agenda internacional e académica, faz sentido relembrar que em 1992 foi criada a United Nations Environment Programme Finance Initiative, uma área das Nações Unidas dedicada exclusivamente a trabalhar o tema da sustentabilidade no setor financeiro. Desde então muito trabalho tem sido realizado, vários acordos voluntários internacionais foram subscritos por bancos, seguradoras e fundos de investimento, mas o tema demorou a ter a sua autonomia a ser reconhecido como estratégico e relevante.

O ano de 2015 marca uma mudança uma vez que coloca, pela primeira vez, o setor financeiro como parte da solução para se atingir um equilíbrio climático mundial. O Acordo de Paris subscrito por mais de 190 países, no seu artigo 2º, define três objetivos globais[4]:

> Manter o aumento da temperatura média global bem abaixo de 2°C em relação aos níveis pré-industriais, e envidar esforços para limitar esse aumento da temperatura a 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais, reconhecendo que isso reduziria significativamente os riscos e os impactes da mudança do clima;

> Aumentar a capacidade de adaptação aos impactes negativos da mudança do clima e promover a resiliência à mudança do clima e um desenvolvimento de baixa emissão de gases de efeito estufa, de uma maneira que não ameace a produção de alimentos;

> Tornar os fluxos financeiros compatíveis com uma trajetória rumo a um desenvolvimento de baixa emissão de gases de efeito estufa e resiliente à mudança do clima.

 

Assim, pela primeira vez existe um documento internacional, subscrito por mais de 190 países, onde estes se comprometem a alinhar o capital com o desenvolvimento de uma economia mais verde e neutra em carbono, capaz de aumentar a sua resiliência às mudanças climáticas, identificando novas oportunidades de negócios e de processos de produção e sabendo incorporar os riscos ambientais nas análises de risco das organizações.

Neste contexto, e por já ter compreendido que o setor financeiro era essencial para se atingir os compromissos internacionais ambientais e climáticos, em 2018, a Comissão Europeia (CE) lançou o Plano de Ação para Financiar o Crescimento Sustentável. De acordo com este Plano de Ação

“o setor financeiro apoia a economia financiando a atividade económica e, em última análise, o crescimento e o emprego. As decisões de investimento baseiam-se normalmente em múltiplos fatores, mas os fatores relacionados com considerações sociais e ambientais não são muitas vezes suficientemente tidos em conta, já que os riscos dessa natureza só tendem a materializar-se num horizonte temporal mais alargado. É importante reconhecer que faz todo o sentido, em termos económicos, tomar em conta os interesses de sustentabilidade a mais longo prazo, e que essa atitude não conduz necessariamente à diminuição da rentabilidade para os investidores.”

 

O Plano de Ação tem como objetivos:

1.     > Reorientar os fluxos de capitais para investimentos sustentáveis, a fim de assegurar um crescimento sustentável e inclusivo;

> Gerir os riscos financeiros decorrentes das alterações climáticas, do esgotamento dos recursos, da degradação do ambiente e das questões sociais; 

> Promover a transparência e a visão a longo prazo nas atividades económicas e financeiras.

Para alcançar estes objetivos, foi definido um conjunto de ações que a CE já tem estado a desenvolver através do “technical expert group on sustainable finance" criado junho de 2018. Este grupo já desenvolveu trabalho sobre a definição da taxonomia, a criação de um Standard Europeu de Obrigações Verdes, a criação de Benchmarks de carbono e na melhoria da divulgação da informação não financeira relacionada com o clima.

Por fim, faz sentido referir que o tema do financiamento sustentável também já é familiar aos vários Ministros das Finanças, uma vez que em abril de 2019, e durante a reunião de Primavera do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, os Ministros das Finanças de mais de vinte países lançaram a Coligação dos Ministros das Finanças para a Ação Climática - destinada a impulsionar uma ação coletiva mais forte sobre as alterações climáticas e seus impactes. Portugal também faz parte desta coligação que ambiciona:

> Ajudar os países a mobilizar e alinhar o financiamento necessário para implementar os planos nacionais de ação climática;

> Estabelecer as melhores práticas, como por exemplo a orçamentação climática e a existência de estratégias de investimento verde e de compras verdes; 

> Incluir os riscos climáticos e vulnerabilidades associadas no planeamento económico dos seus membros.

Torna-se assim evidente que o tema do Financiamento Sustentável irá impactar a fiscalidade e a despesa pública. Será, portanto, necessário ganhar muito conhecimento de forma sólida mas rápida, para que as instituições financeiras consigam incorporar todas as exigências e desafios no seu modelo de negócio.

> Mais informações sobre o Curso Executivo Sustainable Finance

Artigo Redigido por Sofia Santos, coordenadora do Curso Executivo Sustainable Finance, para um artigo da Ordem dos Economistas. 

 

Autor: ISEG - Executive Education